Playlist #43 – Jean-Charles Rosa Posted in: Playlist
Cruxifashion
2020
Slideshow
Lugares, cruzes, corpos com formas ambíguas, por vezes improváveis, tal como nuvens com formas estranhas; e drapeados, por vezes adornados com dourados como se testemunhassem uma era gloriosa e passada, tão fluida e translúcida como um convite à paixão carnal.
Estes corpos sacralizados, nus, enfeitados com tecidos leves que cobrem a privacidade dos corpos sagrados, tornam-se um elemento criativo capaz de tornar essas esculturas em obras contemporâneas, nas quais o fotógrafo jean-charles rosa presta homenagem às diversas formas de apresentar o perizonium.
Livre dos tradicionais padrões académicos, a sua sensibilidade autodidata confere-lhe uma grande emancipação nas escolhas de enquadramento, por um lado, e nos seus métodos de implementação, por outro. E se jean-charles rosa aponta para o desenvolvimento dos códigos artesanais que inspiraram muitos artistas, ele também nos revela um mundo, uma visão através da qual ele próprio tenta entender esses artistas do passado em seus modos de pensar e de conceber. Entre intriga e fascinação, simbolismo e sacralização, o significado permanece oculto.
No entanto, o olho intrusivo da lente, do qual nasceu um grande número de fotos e para o qual Jean-Charles Rosa selecionou, para nosso maior prazer, fotografias tiradas durante suas viagens por Portugal, Espanha e Itália, revela-nos esses corpos de uma forma muito diferente. Sem gênero, efeminados, por vezes sensuais, esses corpos postos na cruz, que geralmente não vemos pelos detalhes, revelam aqui uma visão em tudo diferente, cujo principal elemento continua sendo o hino da paixão.
O artista fotógrafo Jean-Charles Rosa apresenta-nos um slideshow surpreendente, cujo tema a destacar é o entrelaçamento. A originalidade de seu trabalho permanece no fato de que este provém exclusivamente de corpos na cruz. Sejam véus, cortinas em cetim, algodão, linho ou nós elaborados, todas essas formas e materiais nos ajudam a ignorar temporariamente a religiosidade desses fragmentos de corpos cujo objetivo inicial é aparecerem na cruz.
Imagens e ritmos irregulares – lentos, rápidos e vice-versa. E, como se para nos lembrar que precisamos fazer um reajustamento, um profundo preto entre cada imagem. A fluidez das sequências, mas também a intermedialidade dos mediums utilizados pelo artista, reinventam a maneira de conciliar o desejo pelo dito e a consciência do dizer. É por isso que jean-charles rosa inicia o seu slideshow com uma forma quase abstrata que, no entanto, evoca a de um corpo em sofrimento – um corpo vermelho, um corpo em sangue ou o corpo apaixonado que empurra o espectador a querer ver mais – por mais tempo.
À medida que as imagens passam, nosso olhar se torna mais aberto, mais nítido e inquisitivo. Esses nós, comuns e deliberadamente atípicos, gradualmente transformam o nosso olhar até esquecermos a autoridade narrativa dos corpos, que variam da omnipotência à incerteza declarada sem ocupar a frente do palco, e isso Jean-Charles Rosa consegue-o concentrando o nosso olhar na infinidade de detalhes de dobras e nós. O corpo sagrado desaparece em favor de um simples apoio sobre o qual o artista estabelece o elogio do matérico.
Finalmente, Jean-Charles Rosa completa a sua proposta fechando o ciclo com uma imagem forte, na qual o aspecto cromático não aparece sem fazer referência à imagem inicial. Fica assim selada essa odisseia, com um vermelho criador que anuncia uma renovação.
texto de Sónia Ouled Barka
Bio
Lusodescendente, nascido no ano da revolução dos cravos, em França. Depois de viver duas décadas em paris, mudou-se para o porto, perto das suas raizes.
Desde cedo se apaixonou pelo design de moda, área em que se formou e à qual continua parcialmente a dedicar-se. O seu amor pelo teatro, desenvolvido posteriormente e de maneira oportuna, permitiu-lhe também desenvolver as atividades de actor, diretor e figurinista.
Fora do palco, e notando mais nitidamente outros episódios da vida, começou a fotografar. Hoje em dia, envolve-se na observação e registo dos momentos fortes, mas simples, capazes de provocar o nascimento de sentimentos.
‘Cruxifashion’ é a fase inicial de um projeto em desenvolvimento.
EN
Cruxifashion
2020
Slideshow
Places, crosses, bodies with ambiguous shapes that are sometimes improbable, knots with strange shapes, as well as drapings, sometimes adorned with gilding as if to testify to a glorious and bygone era, sometimes fluid and translucent like an invitation to carnal passion.
These sacred, naked bodies, adorned with light fabrics covering their intimacy, become a creative element that makes these sculptures contemporary works in which the photographer Jean-Charles Rosa pays tribute to the various forms of presenting the perizoma.
Freed from traditional academic standards, his self-taught sensitivity gives him great freedom in his choices for framing on the one hand and for their implementation on the other. And if Jean-Charles Rosa points out the development of the artisanal codes which have inspired many artists, he also reveals to us a world, a viewpoint from which he himself tries to understand these artists of the past in their ways of thinking and designing. Between intrigue and fascination, symbolism and sacralisation, the meaning remains hidden.
Indeed, the intrusive eye of the lens, which gave birth to a large number of images, from which Jean-Charles Rosa selected, for our great pleasure, photographs taken during his travels in Portugal, Spain and Italy, reveals these bodies to us in a very particular style. Genderless, feminized, sometimes sensual, these crucified bodies that we don’t usually scrutinise in detail, present an unexpected vision, the overriding element of which is a hymn to passion.
Artist photographer jean-charles rosa presents a surprising slideshow of which the theme is the tying of the perizoma. The originality of his work resides in the fact that these are exclusively images of crucified bodies. Veils or drapes, in satin, cotton, or linen, some with elaborate knots – all these shapes and materials help us to disregard temporarily the religiosity of these body fragments whose initial message is the crucifixion.
Jerky images and rhythms – slow then fast and vice versa. Then, as if to remind us that we need to refocus, each image cuts to a black screen. The fluidity of the sequences, but also the intermediality of the media implemented by the artist, reinvents the way of reconciling the desire for what is said with the awareness of saying. This is why Jean-Charles Rosa starts his film with an almost abstract form which, however, evokes a body in suffering – a red body, a body in blood or a passionate body which incites the viewer to want to see more, for longer.
As the images scroll, our gaze becomes more open, sharper, and thus it becomes inquisitive. These knots, both common and deliberately atypical, gradually transform our gaze until we forget the narrative authority of the bodies which range from all-powerful to assertive uncertainty without the body taking centre stage. Jean-charles rosa achieves this by focusing our attention on the multitude of details of folds and knots. The sacred body disappears; it becomes simply the medium which allows the artist to pay tribute to the materials
Then finally, jean-charles rosa completes his film by closing the loop with a strong image of which the colour brings to mind the first photograph. In this manner he seals this odyssey with a creative red that heralds a revival.
text: Sonia Ouled Barka
Bio
Jean-Charles Rosa is of portuguese-descendance, born in France in the year of the carnation revolution. After two decades living in paris he moved to porto, close to his family roots.
From an early age he fell in love with fashion design, an area in which he graduated and to which he continues to dedicate himself partially. His love for the theater, developed later and in a timely manner, also allowed him to develop the activities of actor, director and costume designer.
Offstage, and noticing other episodes of life more clearly, he began to photograph. Nowadays, he is involved in the observation and recording of strong but simple moments, capable of provoking the birth of feelings.
‘Cruxifashion’ is the initial project of an ongoing visual research.